O procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se pelo não conhecimento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 796, proposta pela Rede Sustentabilidade, na qual se busca o repasse de verbas federais a estados e municípios para a aquisição de vacinas contra a covid-19. Para o PGR, a ADPF não é cabível, porque esse tipo de processo pressupõe a inexistência de outros meios disponíveis. Além disso, não ficou provada nos autos a inércia do governo federal em comprar e disponibilizar os imunizantes, já que esse tipo de processo não permite produção de provas. O parecer analisa questões formais, sem fazer juízo sobre a existência ou não de inação ou demora injustificada na vacinação, por falta da apresentação de provas.
A Rede apontou como ato descumpridor de preceitos fundamentais a mora da União na aquisição e distribuição de vacinas “em número e velocidade suficientes” para o cumprimento do plano nacional de imunização. Em razão disso, o partido pede que se transfira aos estados a responsabilidade pela vacinação da população, considerando-se a competência comum a todos os entes da federação para a proteção da saúde pública, com a devida “contrapartida financeira para fazer frente às responsabilidades”.
Segundo o PGR, a legislação e os precedentes do Supremo já permitem que estados e municípios comprem vacinas. Assim, a ADPF discute estritamente o aspecto financeiro dessa aquisição, condicionada ao reconhecimento da inércia do governo federal. “O pedido de repasse de verbas assume caráter concreto, e há de ser formulado pelo ente que eventualmente suporte o ônus financeiro ou, no limite, que seja impedido de adquirir as doses necessárias em razão da falta de recursos”, escreve Augusto Aras. Esse tipo de pedido se assemelha, em alguma medida, aos formulados em Ações Cíveis Originárias (ACOs) ajuizadas por estados contra a União visando ao custeio de leitos de UTI – o que demonstra que existem outros meios processuais para esse pleito, não cabendo uma ADPF.
A Rede também pede uma medida cautelar para que “seja ordenado à União o repasse financeiro aos demais entes federados para aquisição de vacinas contra a covid-19”, caso o governo federal não demonstre em dez dias que será capaz de vacinar a população brasileira, ou, subsidiariamente, “para garantir a todos os entes federados a compensação dos gastos de aquisição com vacinas contra a covid-19 adquiridas direta ou indiretamente”. Nesse caso, o PGR se manifesta pelo indeferimento do pedido de liminar.
De acordo com o PGR, tanto a legislação vigente quanto as decisões do STF preveem que estados e municípios atuem se ficar demonstrada a inação da União, mas os elementos que constam do processo hoje não permitem afirmar que há inércia ou mora injustificada na condução e na operacionalização da política de vacinação, embora seja desejável celeridade na imunização. Isso porque “há plano nacional de vacinação em execução, com grupos prioritários definidos, e cronograma previsto para novas aquisições”, e mudanças neste momento poderiam atrasar ainda mais as ações em curso.
“Na conjuntura atual, a imposição judicial de repasse imediato de recursos federais parece mais prejudicial que benéfica, não havendo motivo para crer que negociações dos estados e dos municípios poderão superar o empenho atual da União; portanto, ausente a premissa do pedido, que se funda na presumível omissão de ente central”, afirma o procurador-geral.